Se eles soubessem o quanto o dia de amanhã é importante, estavam aqui. Mas não estão. Segue a vida, vivida com confiança em quem nunca nos abandona, em quem nos conhece. Agradeço a Deus pelos obstáculos que põe no meu caminho e pela força que me dá todos os dias para os vencer. Ultrapassei os limites do cansaço e o nervosismo não me deixa, mas confio... Tenho fé. Fé de que o amanhã seja aquilo que eu preciso: um dia sereno com os momentos importantes a correr tal como planeado.
Entretanto, li este poema de Álvaro de Campos e está lá tudo o que havia para dizer sobre o amanhã... Não podia deixar de partilhar um excerto.
ADIAMENTO
"Depois de amanhã, sim, só depois de amanhã... Levarei amanhã a pensar em depois de amanhã, E assim será possível; mas hoje não... Não, hoje nada; hoje não posso. A persistência confusa da minha subjetividade objetiva, O sono da minha vida real, intercalado, O cansaço antecipado e infinito, Um cansaço de mundos para apanhar um elétrico... Esta espécie de alma... Só depois de amanhã... Hoje quero preparar-me, Quero preparar-rne para pensar amanhã no dia seguinte... Ele é que é decisivo. Tenho já o plano traçado; mas não, hoje não traço planos... Amanhã é o dia dos planos. Amanhã sentar-me-ei à secretária para conquistar o rnundo; Mas só conquistarei o mundo depois de amanhã...
Tenho vontade de chorar, Tenho vontade de chorar muito de repente, de dentro...
Não, não queiram saber mais nada, é segredo, não digo. Só depois de amanhã... "
Já aqui tinha dito que ia fazer uma pequena paragem nos assuntos que dizem respeito ao mestrado. Por uns dias apenas, mas uma pausa porque o ano não foi propriamente propício a "tempos livres" e todos precisamos do descanso. É sagrado! Pois bem... não cumpri. Não só já estou a ler outro livro - a história da curta vida de Mário de Sá-Carneiro é muito interessante mas continua a contar como leitura para a tese - como já tenho outros em consideração para ler de seguida. Já sei que na praia ou numa esplanada o livro combina sempre muito bem, mas descansar, na minha vida, combina muito bem com não fazer nada durante uns dias.
Ainda assim, e contrariando as minhas próprias expectativas, uma visita à Bertrand alterou os planos de férias da minha pessoa. Os livros «Pessoa, Portugal e o Futuro», de Onésimo Teotónio Almeida e o «Manifesto Anti-Dantas», de José de Almada Negreiros podiam ser novidades para a estante lá de casa. O primeiro porque nunca é um exagero conhecer a vida e obra de Fernando Pessoa e o segundo porque numa edição de 2013, da responsabilidade de Sara Afonso Ferreira, traz consigo uma gravação inédita que é nada mais, nada menos do que a leitura do Manifesto Anti-Dantas por José de Almada Negreiros, ou seja, it's kind of a big deal.
Livrarias deste Portugal e do outro, o Mundo... há sempre aniversários a chegar na vida das pessoas e quem faz anos não se pode afundar em dívidas!
É certo que já há tempo para respirar por aqui e tempo para aproveitar um pouco mais os dias. Até que enfim.
E porquê? Porque finalmente lá entreguei o projecto da minha tese. Vamos lá ver que tal corre. Mesmo que esteja sempre a ler as obras dos autores que tanto estimo, Agosto vai ser para descansar da pressão que é escrever algo que pode mudar a minha vida. Porque eu também mereço umas "férias" da parte curricular da universidade!
P.S. Uma pequena noção da minha tese através de uma imagem construída por mim com base numa fotografia do maior poeta português de sempre.
"Tu tiveste o sonho de ser a voz de Portugal tu foste de verdade a voz de Portugal e não foste tu! Tu ficaste para depois E Portugal também. Tu levaste empunhada no teu sonho a bandeira de Portugal
vertical sem pender para nenhum lado o que não é dado pra portugueses. Ninguém viu em ti, Fernando, senão a pessoa que leva uma bandeira e sem a justificação de ter havido festa. (...)
Portugal fica para depois e os portugueses também como tu."
A todos os que estiverem pelo Norte não percam esta sublime interpretação de Diogo Infante (com não menos sublime música de João Gil!), em cena no Teatro Nacional de São João até ao dia 13. A "Ode Marítima" não podia ter sido interpretada de melhor forma. Se Álvaro de Campos tivesse existido fisicamente seria exactamente assim. Sem mais, nem menos. Mas a alma, que ele teve e que lhe foi entregue pelo génio da literatura portuguesa que foi (e sempre será) Fernando Pessoa, esteve no São Luiz e viajará agora até ao Porto. E foi bom poder dizer isso pessoalmente ao actor: que representou em palco o Álvaro de Campos que sempre imaginei. Repito: sublime!
O vídeo apenas mostra uma (muito) pequena parte do espetáculo. Se gostaram deste excerto, imaginem o que poderão achar de toda a interpretação no São João. Assim que o espetáculo regressar a Lisboa, aí vou eu de novo. Vale a pena!