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Few days on land

Um retrato do dia-a-dia de uma jovem de viagens quase sempre musicais e nem sempre coloridas.

O melhor álbum de 2021 foi um sonho que durou noite e dia

Viajei no silêncio e encontrei um lugar encantador.

Ali está um prado verdejante onde estendo a toalha para relaxar das preocupações do dia-a-dia. Ao olhar para o lado, tudo o que vejo são flores. Há também uma luz carregada de boas energias. "Agora ficava aqui tão bem uma orquestra", pensei eu, e ela surgiu no rádio. Foi de mansinho a uma tremenda energia em menos de nada. 

Sinto o sol a aquecer-me a pele e a canção da rádio já mudou. Agora são os anjos que, em harmonia, cantam um louvor ao soul. Ora são sussurros, ora são gritos - não me engano se disser que são sentimentos em forma de canção, tantos e tão fortes que vêm na minha direção. A rádio entrou no programa de harmonias e daí não sai mais. 

E se eu dançar? Aí vou.

A roda do vestido vai e volta enquanto salto de felicidade. É o ritmo, é a loucura de tudo funcionar tão bem. E ao mesmo tempo a dúvida de como é possível estar tudo a coexistir tão perfeitamente nesta bolha de amor ao que se faz de bom. Continuo a voltar a esta emoção, sinto que tudo se aproxima de um final apoteótico, mesmo sabendo que é impossível tudo terminar por aqui. Apoteótico foi, porque de apoteótico tem muito. Quero mais.

Tem lá calma porque a manter-se este ritmo, não poderás saltar muito mais. É tempo de um slow, bem livre como me sinto, de braços abertos para o mundo e para a felicidade. Porque é que há tanta harmonia neste lugar? E porque é que toda(s) ela(s) é(são) tão perfeita(s) como banda sonora do que estou a viver? [Saí da pista de dança de fininho.] 

Será verdade? Será possível? Quero ter esperança, mas a dúvida... A dúvida é grave e tem silêncios. Percebo que voltou a orquestra, vem ao longe. Ouço violoncelos tocar uma intensa melodia e a cadência chega do encontro entre tantas outras cordas que manejo com confiança de que algo vai mudar depois deste interlúdio.

E em mim, o que mudou? É agora o melhor momento para pôr em perspetiva a ligação que estou a criar com esta realidade. Se este lugar fosse uma pessoa, seria a minha melhor amiga, a minha estrela guia. Aqui há tudo quanto se pode sonhar num sonho perfeito.

Mas algo melhor está para vir. Pelo menos foi o que sempre nos ensinaram. No matter what, no horizonte estará sempre uma resposta: o que de melhor podes esperar. Faço-o por mim e por todos os que não podem viver este sonho. Maravilhosas estas notas, maravilhoso o perfume deste ar, finalmente respirável. Escolhi ficar para a eternidade. 

Podes contar-me uma história de amor? Prometo chorar de felicidade.

Levas-me a caminhar? Não quero acordar. Estive tempo demais naquele mundo repetitivo, cansativo, exagerado. O que conheci aqui é para guardar, cravar no coração, ao estilo de ide e ensinai.

Vem aí o apoteótico outra vez. O som aumenta. Agora o ritmo é ainda mais vigoroso e as harmonias virtuosas. Se é para me divertir, regresso à pista de dança e prometo não voltar a sair de lá, venha o que vier. Serei famosa nesta minha viagem ao paraíso! Mas... O que é isto e quem mudou a música de repente? Falso alarme, era só para o saxofone dar um ar da sua sonora graça. Aliás, quanta mais diversidade houver, mais sentido a música vai fazer, aprendi isso neste sonho. Sinto-me em casa.

Vou dançar e não vou sozinha, os anjos levaram-me pela mão. Estou junto à praia. Sinto que posso ser tudo, ter tudo, sentir tudo e que o mundo não é mais do que isto. 

Agarro-me ao tempo deste sonho. Peço-lhes um momento. Deram-me esperança, deram-me alegria, deram-me luz. Aqueceram o meu coração. Senti, vivi, dancei, chorei. Amei.  

O sonho foi curto.

Podia viver neste sonho? Por favor.

Os melhores discos de 2021 (02-06)

Estamos quase, quase a revelar o melhor disco de 2021, mas enquanto a lista não chega ao número 1, aqui ficam os discos entre a 2.ª e a 6.ª posição. Tal como no post anterior, escrevi também uma pequena explicação do porquê de serem parte do meu top 10. Enjoy!

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A verdadeira voz do soul nos dias de hoje! Believe me and listen to "Where You're At". Superb.

Este álbum é uma combinação de 11 dos maiores sucessos de Allen Stone que, parecendo que não, começou a editar em 2009 e conta já com quato LP's. Este, gravado em Washington pela ATO Records, apresenta as canções favoritas dos fãs trazendo de volta a essência da sua composição  que se resume nos instrumentais e voz mais naturais, reduzindo os arranjos e as camadas que as anteriores ganharam no processo de gravação - algo muito evidente em "Consider Me", por exemplo, cujo ritmo foi diminuído e é agora uma canção ainda mais soul e muito menos pop, para além de ter uma base de piano muito mais presente, num momento intimista. "I Know That I Wasn't Right" é outro desses momentos extremamente intimistas do álbum.

A sua voz é doce, é "quente" porque conforta, é como um abraço. Ao mesmo tempo, APART é um disco sexy! Há muito romance nas letras de "Lay It Down" - nos versos Wanna be the first thing you reach for in the morning and the last thing you put down at night e, mais à frente, keep me close enough to fit inside your pocket, let me see inside the windows through your heart; mas também em "Give You Blue" - na qual escreve I can't stop the rain but I will keep you dry/if the shore feels far awayI'll be by yourside/when the storms arise I will shelter you/when your sky is gray I will give you blue (mas que ideia, que visual tão bonito!). "Consider Me" é o apogeu do romantismo.

Sem dúvida que o Allen fez muito bem em revisitar estas canções!

Melhor canção: Brown Eyed Lover

Melhor letra: Where You're At

Melhor vídeo: Is This Love (Bob Marley cover)

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Um dos discos mais esperados de 2021 para mim era este Loving In Stereo dos Jungle. Quem vai vendo/lendo o que publico por aqui sabe que eles são uma das minhas bandas favoritas e, portanto, a "ansiedade" de saber o que seria este novo trabalho era muita e as expectativas estavam elevadas. Cumpriu. A selva é uma festa!

Energia, emoção e uma vontade IN-CON-TRO-LÁ-VEL de dançar! Assim, em maiúsculas, como a alegria que conseguem provocar-nos. 

É um disco que chega especificamente para alegrar-nos. A primeira canção, "Dry Your Tears", avisa que não há lugar a tristeza e que You gotta move it/keep moving logo a partir da canção n.º 2. Em poucos segundos estou a tentar coordenar o bater palmas com o "pézinho", a estalar os dedos e com os braços no ar... É que até as canções mais calmas têm um groove "jungleriano" que possivelmente deriva da importância que atribuem aos instrumentos de percursão - presença icónica nos concertos da banda e que fica sempre evidente nos discos - aliados à conjugação das guitarras, do piano e dos coristas. Essas vozes secundárias que de secundárias nada têm.

O início de "Fire", por exemplo, é a forma perfeita de explicar porque é que esta banda sabe escolher os nomes das canções. Impressionante linha de guitarra, mais uma vez com o groove de uma grande panóplia de sons vindos da percurssão e do grupo de segundas vozes que entoam magistralmente as poucas palavras desta letra, recorrendo a agudos de ritmo acelerado, outra característica dos Jungle. E se pensavam que ficava por aí o "fogo" do disco, logo a seguir está a "Talk About It" que deve render bastante nos festivais, fazendo jus à fama dos Jungle a criar refrões poderosos para serem entoados por grandes amontoados de pessoas, que a Covid tem impedido mas não por muito mais tempo. Do que me lembro, as pessoas cantam até as notas, nem é preciso que a música tenha palavras, tal é o entusiasmo de estar num concerto deles (um dos melhores concertos que já vi e no que mais me diverti - se é que posso adicionar).

Graças a este disco descobri a Priya Ragu, colaboração na música "Goodbye My Love", que foi também uma das belas descobertas do ano.

Thanks for making me stronger, friends. Cheers!

Melhor canção: All Of The Time

Melhor letra: Goodbye My Love ft. Priya Ragu

Melhor vídeo: Keep Moving (sem dúvida o vídeo do ano!)

 

[Nota intermédia: Agora é que vão ser elas. Elas no feminino e elas porque são dois discos bastante emocionais. Bare with me people!]

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Atenção, atenção. Se não queres encontrar uma melhor amiga com quem dividir as tristezas da existência, não ouças Little Oblivions. É que Julien Baker é bastante profunda na exploração da sua relação com o mundo e as pessoas. Questiona-se, põe em evidência, talvez até se martirize no processo.

Esta realidade está presente em "Hardline", canção que abre o disco e nos diz "preparem-se para pensar sobre vocês mesmos e as vossas ações". Senão ora leiam: All the future things I will destroy/That way I can ruin everything/When I do, you don't get to act surprised. Umas canções mais à frente, três para ser precisa, escreve na #Relative Fiction": Dying to myself virtually, a massacre/A character of somebody's invention/A martyr in another passion play/I guess I don't mind losing my conviction/If it's all relative fiction anyway.

Podemos esperar isto ao longo do disco. Assim como podemos esperar uma conjugação guitarra/bateria claramente a dizer olá ao rock/indie rock/alternativo. Destaco os instrumentais de "Crying Wolf" - os riffles do meio da canção são a cereja no topo do bolo; a bateria de "Favor"; o piano de "Song In E". 

Julien Baker tem também uma voz muito doce, mas que parece algo "assombrada", muitas vezes é um sussurro, outras tantas é uma força que catapulta - na "Song In E" coexistem -, quando necessário também utiliza a sua voz mais áspera, crua. E a emoção passa. É daquelas vozes que ouvimos e sabemos quem está a cantar, diferenciada.

Melhor canção: Highlight Reel

Melhor letra: Crying Wolf

Melhor vídeo: Hardline

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Collapsed In Sunbeams é o disco de estreia da britânica Arlo Parks, alter ego de Anaïs Oluwatoyin Estelle Marinho (não tem ascendência portuguesa), e chegou a nós logo no início deste ano - janeiro - pela Transgressive Records. Não fosse a Covid-19 e este seria um álbum de 2020.

De voz angelical, doce, carismática, preparou 12 canções para se apresentar ao mundo. E conseguiu fazê-lo, captando o interesse de todos aqueles que a nomearam como nova promessa da música britânica.

Começa por demonstrar os seus dotes como poetisa com uma faixa homónima do álbum. Depois disso, é um "corridinho" de boas vibes, ainda que nem sempre os temas abordados nas letras sejam compatíveis com essa abordagem. É o caso de "Hurt" com um refrão tremendamente melódico que não transmite a energia da letra - Oh, wouldn't it be lovely to feel somethin' for once/Yeah, wouldn't it be lovely to feel worth something; ou de "Hope", onde escreveu You're not alone like you think you are/We all have scars, I know it's hard, mas que canta com bastante leveza e gingar. Ou seja, no fundo tem um pouco de Julien Baker ao escrever, mas uma onda leve e divertida a cantar.

É uma onda algo pop e R&B que funciona muito bem quando sabes escrever canções - e, no caso de Parks, poemas. Ser um álbum de estreia e estar tão bem cotado a nível internacional só nos faz ter esperança no que o futuro trará à carreira de Arlo Parks. Aguardo com muita curiosidade por próximos capítulos.

Melhor canção: Eugene

Melhor letra: Hope

Melhor vídeo: Too Good

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Em julho escrevi que relacionava a música "Say That You Will" com os primeiros tempos da pandemia. Nos pequenos concertos que fazia em direto no Instagram, James Blake já tinha apresentado algumas das novas canções deste Friends That Break Your Heart. Fiz referência ao tempo que passou entretanto e como pouco tinha mudado no que à pandemia dizia respeito. Constantes mini confinamentos, o teletrabalho, o ter de ficar em casa e contar com a cultura para entreter-nos... Aquelas notas no piano, acompanhadas da voz de Blake, que é daquelas vozes que soa ainda melhor ao vivo, traziam-me esperança. Como, aliás, todo o disco traz.

Podia ser facilmente o disco do ano e durante algum tempo foi. Tive de afastar-me do meu entendimento de fã - vá, super fã! - para fazer a avaliação que, até então, mandava o coração. De facto, não há uma única possibilidade de James Blake lançar um disco que não esteja nas listas de melhores álbuns do ano deste blog e dos meios de comunicação por esse mundo fora. O que Blake consegue fazer sozinho - o homem banda, agora também Sr. actor (talvez por influências da incrível Jameela Jamil, sua namorada) - seja em palco, nos festivais, ou em casa com um piano e a sua voz maravilhosa é de arrepiar. Ele sabe, como poucos músicos que conheço e admiro, colocar apenas o necessário em cada canção. O estritamente necessário para funcionar. Essa simplicidade emociona-me. Ele assume os momentos imperfeitos da canção, tornando-os perfeitos com giros vocais do extremamente grave ao agudo angelical, canto a capella, instrumentais em crescendo, pequenos jeitos electrónicos - como acontece com Say What You Will, só para dar um exemplo.

Para as melhores canções, selecionei três. Não me peçam para escolher uma, não consigo, este álbum é todo ele brilhante. E temos de considerar que James Blake é o cantor, o compositor, o letrista, o produtor, o actor, o magnífico ser humano que vemos plasmado nestas canções. Como é que eu sei que ele é um magnífico ser humano? Porque só alguém com um coração do tamanho do mundo consegue chegar a tantos outros corações e emocioná-los com simplicidade e verdade.

Termino com uma parte do que escrevi em Julho: "Se esta pandemia tinha algo para nos ensinar enquanto sociedade, não ensinou. Mas pelo menos James Blake comprometeu-se a deixar esse ensinamento a quem quiser confiar nele. Eu confio. E ele nunca desilude". É uma história de amor a nossa.

Melhor canção: I'm So Blessed You're Mine + If I'm Insecure + Lost Angel Nights

Melhor letra: Friends That Break Your Heart

Melhor vídeo: Say What You Will (com a presença de FINNEAS e o Sr. Actor James Blake!)

P.S. Os nomes de artistas e músicas que estão escritos em minúsculas foram assumidos dessa forma pelos músicos e, portanto, foi respeitado o estilo pretendido pelos autores.

P.S. 2 - Como nota à navegação, comunico que este post não foi publicado em dezembro de 2021 (#iwish) mas como atualmente (fevereiro 2022) valores mais altos se agigantam, não me apetecia confundir as coisas e dar mais importância do que isto tem na realidade. Para além de que já não faz muito sentido publicar coisas como se fossem novas mas que estão no passado. Anyways... Estes textos foram escritos ainda em 2021 só ainda não tinha tido tempo de passar por aqui. Mas neste blog acabamos o que começámos.

Os melhores discos de 2021 (07-10)

Segue a lista! Desta vez com os discos entre a 7.ª e a 10.ª posição dos melhores álbuns de 2021 e com uma pequena explicação do porquê de estarem no meu top 10.

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Seria a Avril Lavigne dos tempos modernos, a nossa Marie Ulven Ringheim aka girl in red. E por nossa, entendam cidadã do mundo, já que ela é norueguesa. Por outras palavras, o álbum "if i could make it go quiet" vem confirmar que girl in red é uma contadora de histórias ora ritmadas, ora embaladas, com reflexos rock + punk + pop. Podemos dizer que o conjunto de canção aqui apresentadas são uma descrição bastante pessoal de medos, dúvidas, emoções. As descrições são claras, exemplo disso é a frase "can't escape the corners of my mind", da canção "Serotonin". Se é daquelas pessoas que gosta de acompanhar a letra para perceber a história da música, vai certamente gostar deste disco que passa por várias fases ao longo dos 11 temas. girl in red foi uma das melhores descobertas do ano e um álbum para guardar.

Melhor canção: rue

Melhor letra: serotonin

Melhor vídeo: body and mind

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Salvador Sobral dispensa apresentações e falar dele seria fácil não fosse tão complexo o artista e a sua arte. É dos melhores cantautores que este país viu nascer. Não há palavra que não esteja no sítio certo. A sua voz é doce o suficiente para dar corpo a cada melodia. E nos entretantos supreendem-nos todos os giros que consegue fazer com o seu registo vocal, do mais grave ao mais agudo. E quando canta em português, a magia é digna dos contos de fadas. Daí este bpm e as suas 14 canções serem tão especiais. Este é o albúm mais português de Salvador até à data e embora seja impressionante o número de línguas em que consegue cantar, quanto mais cantar em português mais vai encantar.

Melhor canção: fui ver meu amor

Melhor letra: só eu sei

Melhor vídeo: paint the town

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A viagem é a saltitar: olá Chet Faker, até já Nick Murphy. Ele vai mudando e nós vamos tentando acompanhar porque qualquer nota que componha, qualquer palavra que escreve vai soar bem. É certo. Certo como o destino, ou as estrelas, ou o bem que nos fazem sentir as suas músicas. Dificilmente há alguém mais cool do que o próprio (ou os alter egos) e a tradicional vibe, o groove "chet fakeriano", está nos píncaros. É o caso da "Get High", em que o groove do instrumental combina tão bem com a voz extremamente melódica, como se fosse uma voz ainda mais cantada do que o normal. Há alguns casos do tradicional Chet Faker, como em "Feel Good", e de apostas para dar corpo aos instrumentais, com harpas e um claro investimento em trazer mais instrumentos de corda às suas canções. Whatever tomorrow, give me this anytime.

Melhor canção: Get High

Melhor letra: Whatever Tomorrow

Melhor vídeo: Feel God

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Da parte de Oscar Scheller chega-nos a maior das novidades: os rapazes também choram. Uma boa nova que se tornou não só uma belíssima canção, mas também um álbum que recordarei por muitos anos. Já me tinha acontecido com o primeiro álbum dele, Cut and Paste, de 2016.

Impressiona-me sempre pelas linhas de guitarra que compõe, pela importância que dá ao ritmo, marcado, algo que até nas composições mais serenas não escapa. É um bom cantor de melancolia dançável. Não é um estilo, passa a ser. Podemos até não conhecer as suas músicas mas tenho a certeza que quem as ouve pela primeira vez consegue marcar o ritmo com o pé ou quem sabe até mexer os ombros ao de leve ou viajar sem sair da imaginação.

Sabem aquela tarde de merecido descanso junto à piscina? Bem, eu não tenho piscina porque se tivesse este álbum seria a companhia perfeita para passar essa tarde. Ao estilo netflix and chill, estão a pereber? Uns raios de sol, uma brisa, calor q.b., óculos de sol ea voz doce de Scheller como banda sonora. Name a better combo, I'll be waiting.

Melhor canção: Peach

Melhor letra: I'm Enough

Melhor vídeo: Boys Cry

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Sam Fender é o "senhor rock" desta lista. E provavelmente do UK. A ascensão depois de "Play God" está a ser condizente com a força que ele coloca em cada refrão, em cada palavra. Cada canção é cantada como se de uma história se tratasse. As letras são factuais, por vezes de crítica social, mas sempre actuais.

Os instrumentais são A loucura de poderosos. Ouvimos isso mesmo em "Spit of You", com as guitarras a serem responsáveis por 90% do show que é esta canção. Com linhas instrumentais carregadas, fortes, encorpadas, Sam Fender oscila de maneira vertiginosa entre os graves e agudos que a sua voz consegue entregar. Até nas canções mais serenas, como "Long WayOff" ou "Last To Make It Home", estas características são claras.

Melhor canção: Get You Down

Melhor letra: Pretending That You're Dead

Melhor vídeo: Saturday

P.S. Os nomes de artistas e músicas que estão escritos em minúsculas foram assumidos dessa forma pelos músicos e, portanto, foi respeitado o estilo pretendido pelos autores.

P.S. 2 - Como nota à navegação, comunico que este post não foi publicado em dezembro de 2021 (#iwish) mas como atualmente (fevereiro 2022) valores mais altos se agigantam, não me apetecia confundir as coisas e dar mais importância do que isto tem na realidade. Para além de que já não faz muito sentido publicar coisas como se fossem novas mas que estão no passado. Anyways... Estes textos foram escritos ainda em 2021 só ainda não tinha tido tempo de passar por aqui. Mas neste blog acabamos o que começámos.

O melhor de 2017: álbum do ano // Few days on land

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Susanne Sundfor. É ela a artista do ano. É dela o melhor disco de 2017.

 

Music For People In Trouble foi lançado em setembro mas Susanne já havia apresentado uma das faixas em 2016, numa gala de prémios. "The Sound Of War" já fazia prever um disco marcante, com uma melodia que nos traz à memória canções medievais e a voz frágil - os agudos são muito bem conseguidos mas a voz é fina e portanto pode parecer-nos frágil mas rapidamente percebemos que é uma voz muito poderosa. A apresentação da música decorreu numa noite em que a norueguesa foi galardoada com os prémios Álbum do Ano, Produtora do Ano e Melhor Artista Pop do Ano nos Norway's Spelleman Awards (os prémios correspondem ao ano de 2015 e mostram-nos que a qualidade elevada do trabalho da artista não é de 2017).

 

 

Na verdade, Music For People In Trouble começa com "Mantra", uma canção reflexiva em que guitarra dá conforto à voz melancólica e à entoação das palavras. Como uma canção de encantar, Susanne fala-nos ao ouvido numa letra muito ligada aos elementos. São feitas referências relacionadas com o elemento água: "looking down on a lagoon (...) I'm as mighty as a shark"; mas também com o elemento terra: "making all the flowers glow". A norueguesa refere-se também ao espaço quando se declara tão sortuda quanto a lua. No final da canção ouvem-se os sinos ao estilo dos casamentos reais (pelo menos foi isso que me fez lembrar). Na versão do disco, "The Sound Of War" abre com sons da natureza para depois aparecer então a canção um tanto medieval. Nota-se bem como foi tudo pensado ao pormenor.

 

As baladas seguem com "Reincarnation", na guitarra sempre com trejeitos e tempos marcados, as palavras arrastam-se na melodia que a letra ilumina com o retratar do estado do mundo, as questões que todos colocamos e sobre as quais Susanne quer refletir. "Good Luck Bad Luck" traz o piano às canções de embalar e apresenta-se como a música onde podemos conhecer mais sobre a voz da cantora e sobre o seu universo neste álbum. Há tempo para tudo: palavras mais marcadas intercaladas com fins de frases arrastados, agudos misturados com graves - ambos os registos desempenhados com distinção -, um canto entre o clássico e o lírico, e até um solo com inspiração jazz (tem contrabaixo e saxofone e está tudo dito).   

 

 

 

"Music For People In Trouble" é a canção que dá nome ao disco. Como já disse anteriormente, quando os discos têm nomes relacionáveis, é logo um ponto a favor. E penso que todos nós conseguimos olhar para o mundo e relacionar o que se passa à nossa volta (e tantas vezes connosco) com o nome do álbum. O início é parcialmente psicadélico, com ligeiras alusões ao electrónico. E uma voz fala. É a voz de Andres Roberts, amigo de Susanne Sundfor, que é montanhista e tem um projecto que consiste em preparar as pessoas para retiros na natureza (coisa para lidar sozinho com a natureza durante longos períodos de tempo). Mais uma vez a natureza é a base da canção. A flauta é chamada para abrilhantar o instrumental. Não há letra, mas daquilo que é dito no monólogo de Roberts fica este lindo entendimento: "we don't do life, we don't choose life, life does us". Bonito!

 

A música "Bedtime Story" pode parecer-nos mais uma canção de embalar (e pela voz seria) mas o que é certo é que a letra conta-nos uma história menos positiva. Ouve-se em "because I always meant it when I said it would go wrong/ because I always thought my life would be a sad song"; ou em "what am I but a bad story teller?". A melancolia aparece também em "and when the nights are cold and strange and all the birds are gone/ (...) I'll think about the time you reassured me you were mine". É de Susanne Sundfor um dos versos mais bonitos do ano, sobre o amor claro: "oh, what is love but a frail little dreamcatcher?". De notar ainda que o conhecimento musical desta cantora é impressionante, mais do que não seja porque traz ao álbum instrumentos que nem sempre ouvimos com a atenção que eles nos merecem, aqueles que muitas vezes não têm o espaço melódico devido para brilhar. E ela faz isto muito bem no disco. No caso de "Bedtime Story" é o clarinete, mas são vários os instrumentos que ganham visibilidade com Sundfor.

 

Segue-se a minha música favorita, "Undercover". É a letra, é a melodia, é o alcance vocal, é a energia e o sentimento... É uma grande canção, não se pode fugir a isto. A par de "Good Luck Bad Luck" é aquela que mais dá a conhecer as características vocais e artísticas de Susanne Sundfor, a acentuação, o piano melancólico e os agudos imponentes que são difíceis a qualquer ser humano, mas que são marca desta artista. Vale a pena ouvir e voltar a ouvir quando ela começa com a marcação dos versos finais da música, "it wouldn't even matter/ If you didn't even bother/ To be more than a lover/ It wouldn't even matter/ If I didn't even bother/ To believe in a forever, no". É uma belíssima composição musical.

 

 

A música que vem a seguir não se chama "Verdade Universal" mas devia porque "No One Believes In Love Anymore" é praticamente uma tradução para inglês de tal frase. "The world has gone off the hinges, and the spinning begins" é um dos versos que nos explicam porquê. "A downards spiral, punctured balloon/ disfigured and pale looking up at the moon/ up at the moon/ we’ll all get there soon" confirma a história. A flauta ajuda a melodia a levar-nos para o imaginário onde possamos refletir sobre os problemas e as questões sérias que enfrentamos diariamente. O solo de flauta no final é idílico. Talvez púdessemos encontrar solução para o mundo como está nos dias de hoje. Talvez.  

 

O fim aproxima-se. O disco não é muito extenso, tem apenas 11 canções. Fossem todas as 11 canções dos álbuns de 2017 como estas, com tanto conteúdo, e não saíamos daqui nem em 2020. Ficam a faltar duas músicas: a futurista "The Golden Age", que conta com uma voz off que não sei identificar (ainda que esta tenha letra para além do monólogo) e volta aos sons mais electrónicos, experimentais, psicadélicos que a certa altura são substituídos por uma melodia suave que traz de volta a melancolia, ainda que estejam no instrumental as inspirações "futuristas"; e a arcaica "Mountaineers", com John Grant (músico americano de indie rock) a entoar um cântico que nos lembra canto gregoriano e que só quando Susanne Sundfor começa a cantar começa a ser menos críptico. Repito: o alcance vocal desta artista é impressionante. O tom é bonito, mas o alcance vocal, algo entre o canto lírico e as inspirações pop que terá, é coisa para deixar uma pessoa absolutamente rendida à energia e ao sentimento que Susanne carrega na voz. Eu já gostava da voz dela, mas acho que neste disco está muito mais clara, definida, se posso dizer assim. Já para não falar da escrita das letras, que é de quem sabe das coisas do mundo. É de quem se inspira no que vê, no que sente. E isso para mim é mais de meio caminho andado, bem sabem. Ora atentem nos últimos versos de "Mountaineers": "what it is, what it means/ now I know, will never be what you need, no/ what we are, what we want, it will never change/ we will break through your walls, unstoppable". Isto é de quem sabe da vida, vivida e sonhada. Ponto.

 

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Quanto a Susanne Sundfor, acompanho o seu trabalho desde que lançou uma música com os M83 para a banda sonora do filme Oblivion, em 2013. Não vi o filme, não ouvi o resto da banda sonora porque o que ouvi chegou-me. A música foi-me sugerida porque eu gosto muito dos M83 mas o que me interessou mais foi aquela voz límpida e emocionante. Ainda por cima foram ao programa do Jimmy Kimmel apresentar a música e percebi que ela canta mesmo assim ao vivo. Depois fui ouvir os álbuns mais antigos e olhem... Fiquei sem palavras. Como dizem em inglês (só porque fica mais pomposo) breathtaking. Assim mais para dançar, a dupla norueguesa Röyksopp lançou uma música em colaboração com a Susanne que também gostei muito. Resumindo... Até hoje sou fã. 

 

O disco foi disponibilizado no Youtube de Susanne Sundfor. Já tiveram oportunidade de ouvi-lo? O que acharam?

 

Álbuns de 2017: The Death Of You & I, de Isaac Gracie

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Vozes como a de Isaac Gracie não aparecem todos os dias. Quando aparecem fazem a diferença, marcam-nos. Não sei se foi a força da voz ou a fragilidade dos sentimentos que descreve. Talvez saiba. Ambas coordenam-se muito bem e é muito difícil não sentir na mesma magnitude do artista. Mas de Isaac Gracie e da sua carreira até 2017 pouco mais há a escrever ou não estivesse já tudo escrito numa das mais recentes publicações do Few days on land.

 

Em 2017, sim, há algo tão importante e distintivo a apontar como o primeiro EP do músico. "The Death Of You & I", lançado a 29 de Setembro de 2017, é composto por quatro faixas: duas com um cunho mais grunge e duas mais identificadas com o rock em estado puro. Se estão a pensar como podem ouvir o disco, ao mesmo tempo que vão lendo o texto, digo-vos que não seria necessário comprar o EP uma vez que Isaac Gracie disponibilizou-o no Youtube e nas plataformas digitais (Spotify e etc.). Eu recomendo-o por ser um disco diferente de todos os que tenho ouvido e o que mais me surpreendeu este ano. É uma boa compra para os amantes de nova e boa música e para quem quer conhecer novos artistas que em breve serão referências.

 

"The Death Of You & I", a primeira faixa do EP (ou não fosse esta a música que dá nome ao disco, não é?) é apoteótica. A guitarra dá início a esta viagem, mas é a entoação de Isaac logo nas primeiras palavras, "Running into one another...", que arrepia. A rouquidão, percebe-se dois versos mais à frente, é apenas um dos dons do músico, que também impressiona com notas mais agudas. E as duas características, tão peculiares, misturadas no final de uma das frases, quando diz "no matter how you try"? Já estava apaixonada por este disco mas ainda uns segundos longe de imaginar que o refrão ia ser tão poderoso. E bastam sete palavras: "since the death of you and I". Sinceramente, não sei como é que a guitarra aguenta até ao fim da música... Mas, ainda sobre o refrão, querem mais grunge que isto? Fez-me lembrar uma e apenas uma pessoa (disse aqui quem é essa pessoa mas penso que vocês podem identificá-la facilmente). "The Death Of You & I" não termina sem ganhar um ritmo mais acelerado de bateria e guitarra que a certo ponto até parece samba (como assim? é ouvir para tirar as dúvidas). E o fim? Pois, a música termina de forma absolutamente apoteótica, servindo-se do refrão marcante para finalizar em beleza e com poder.

 

 

Quem acha que Isaac Gracie vai precisar de mais do que uma guitarra e uma voz única, engana-se logo ao início de "Silhouettes of You", uma canção mais calma. A conjugação da voz rouca com os agudos é ainda mais evidente com o instrumental em serviços mínimos, o que se mantém até depois do primeiro refrão, quando o instrumental fica mais completo com a bateria a marcar ritmo. Aqui a identificação com o género grunge chega mais marcada através das letras, ainda que mesmo assim sejam evidentes as influências do artista: o cansaço mistura-se com a saturação do momento que se vive em "my anxieties have promised me the worst is to come, so give up living for the life that you paid for"; ou o mundo que se construiu começa a desmoronar, "and all the lies I tried to live by start falling apart whoever knew that it could be so painful". Adoro a parte em que ele canta o verso "I'm sick of standing by your window tracing silhouettes of you". Parece-me tão profundo a nível sentimental, tão sofrido. De fazer chorar as pedras da calçada.  

 

 

Se achavam que faltava uma flauta para dar um ar mais oriental ao disco, ela chega em "One Night", uma das faixas alternativas, talvez a menos sofrida do EP, com um refrão que é rock no seu sentido mais puro. Nas letras, Isaac Gracie continua a referir-se a corações partidos, amores ameaçados, assassinatos na pista de dança ou falta de interesse no que e com quem se vive no presente. Se bem que no meio disto tudo, as verdades são mais que muitas, como quando canta "all the things you can't stop they're not worth the problems". Sigamos a dica. Posso só repetir que este refrão é fantástico e que a flauta faz toda a diferença nesta música? Que melodia, senhoras e senhores! Que melodia. E quando conjugada com as segundas vozes então... Nem há palavras para tamanho engenho e mestria na composição.

 

 

"Love (Ain't Always So Good)" é a última música do EP e começa, tal e qual uma canção de embalar, a surgir aos poucos. Abraça-nos, envolve-nos naquela voz sussurrada e rouca, acompanhada por uma guitarra e um piano. Exactamente como se pede numa canção para adormecer. Não fosse a letra um tanto ou quanto sombria (pelo título já se previa) e conseguiríamos descansar das maleitas da vida. Bem, talvez não, porque seria impossível dormir sem antes ouvir a canção até ao último segundo. O espanto, por surgir uma canção assim a fechar o disco, e ao mesmo tempo a adoração a uma melodia sensível, com a letra de quem já não sabe com certeza quais os sentimentos que tem ("because is love to love you but I'm still unsure (...) I know that you know that I gave you more than I should, I guess that means love ain't always so good"), mas que não duvida que o problema começa em si ("there's still some problems that I need to cure"). 

 

 

Acho que ficou clara a minha admiração por Isaac Gracie e pelo EP "The Death Of You & I". É certamente um dos melhores discos do ano 2017 e, não querendo adiantar muito, está em muito boa conta na listagem final. O que acharam?

 

A fotografia utilizada neste post foi retirada da loja de Isaac Gracie, onde o disco está disponível para compra.